08 setembro 2020

CARTA À MINISTRA

 A Sua Excelência

Dra. Carmen Lúcia Antunes Rocha

DD. Ministra do STF


Excelentíssima Senhora Ministra,


Há algumas semanas escrevi uma carta aberta ao Ministro Luiz Edson Fachin a respeito das ações vistas como polêmicas desse Ministro e de alguns de seus pares. No texto, era feita menção – sem citar nomes – a alguns desses pares, todos eles homens. É claro que as ações que citei não tinham qualquer intenção de esgotar o tema, mas reconheço que não me veio à mente qualquer atitude polêmica por parte das ministras da Corte. Mas eis que, nesses últimos dias, V.Exa. nos brinda com uma: nomeadamente, o questionamento feito ao Presidente da República  e ao Ministro da Defesa sobre o uso das Forças Armadas nos nove estados da Amazônia Legal, a pedido do Partido Verde.

Como não poderia deixar de ser, o ato suscitou reações contrárias e até acaloradas por parte das autoridades militares e também por milhões de patriotas nas redes sociais. V.Exa. reconhece que é a Amazônia um tema com forte apelo emocional. Tem sido assim desde a década de 1960, quando a comunidade internacional – certamente incomodada com o governo militar à época, que tomou atitudes importantes para integrar a região, entre elas a criação da Zona Franca de Manaus, o Projeto Rondon e a implantação do Comando Militar da Amazônia – passou a ter um interesse especial numa área que, até então, parecia estar em outro planeta.

A Amazônia, de uma hora para outra, virou o “pulmão do mundo”, uma “área de rara biodiversidade”, o “lar de comunidades indígenas ameaçadas” e tantas coisas mais. Por trás de tudo isso, havia o estranho conceito de que, sendo “patrimônio da humanidade”, a Amazônia teria de ser “internacionalizada”, sendo Monsieur Emmanuel Macron apenas o mais recente líder mundial a tocar no tema. Fica no ar a ideia de que, não tivessem os governos pós-1964 sido firmes, essa “internacionalização” já teria ocorrido. 

Senhora Ministra, é impossível imaginar outra forma de defesa de território que não seja pela atuação das Forças Armadas. E é aí que vejo com muita estranheza a maneira como o Partido Verde justificou o pedido feito a V.EXa. , alertando contra a “militarização da preservação ambiental”. Deve-se depreender daí que esse partido, que se junta sistematicamente à comunidade internacional na condenação da política do governo atual em relação à Amazônia, prefere uma Amazônia “internacionalizada” a uma Amazônia “militarizada” por brasileiros? Não é a soberania exatamente o primeiro princípio fundamental da nossa Constituição?

Permita-me comentar que impressionam as escalas de tempo que o nosso Supremo emprega. Quando partidos políticos questionam o governo, os prazos são usualmente de poucos dias. Quando o PDT e o Psol entraram com pedido de liminar para suspender a nomeação do Del. Alexandre Ramagem para a Direção-Geral da PF, o Supremo expediu a liminar em menos de 24 horas. Na ação objeto deste texto,  V.Exa. deu 5 dias para que o Presidente e o Ministro da Defesa respondam ao questionamento do Partido Verde.  Por outro lado, quando teve resposta a ADI 6494, ajuizada em 25 de julho último pelo Presidente junto ao Supremo, que questionava a constitucionalidade do bloqueio das contas em redes sociais de várias pessoas e pedia a suspensão desse bloqueio?

V.EXa. é uma pessoa competente e capaz, ou não estaria onde está. E sabe do papel extraordinário e único das Forças Armadas, não apenas na defesa do território amazônico brasileiro, como também no apoio vital aos que nele habitam. A Marinha, o Exército, e a Aeronáutica constroem infraestrutura, transportam alimentos, medicamentos e pessoas, tratam doentes, prestam socorro, resolvem conflitos, em suma, é possível apenas imaginar que tragédia resultaria da retirada dos militares da região. Com relação à proteção ambiental, V.Exa. também está a par das carências de pessoal fiscalizador civil, de forma que também cabe aos militares atuar nessa área. Com o devido respeito, no momento em que V.Exa. endossa um pedido como o do Partido Verde, coloca em questão seu conhecimento sobre esses assuntos, algo que foi explorado nas redes sociais. Sem contar que, como membros do Congresso, os parlamentares do Partido Verde teriam todo o direito de fazer o questionamento diretamente ao Executivo.

Recentemente o Ministro Marco Aurélio Mello teve a coragem, em entrevista, de afirmar que o Supremo está sendo, como no caso da Abin, “utilizado pelos partidos de oposição para fustigar o governo”. E acrescentou: “Isso não é sadio. Não sei qual será o limite”. Realmente, não é sadio que partidos se utilizem da mais alta Corte, que por lei deve ser neutra, para fazer política. E a coisa fica pior quando – mesmo que neste caso possa ter sido involuntariamente – os partidos dão azo a que se suspeite que membros dessa Corte desconheçam a realidade nacional.

Ao ensejo, apresento meus protestos de consideração e apreço.


Atenciosamente,


Prof. Heldio Villar

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